domingo, 11 de maio de 2008

É engraçado como os verbos ter e haver se tranformaram apenas em verbos auxiliares do partícipio. Nada mais há e nada mais tem. A não ser auxílio. E essa verdade funciona bem melhor em inglês.

(a menina olha o celular de quatro em quatro minutos. era necessário que alguém lhe ligasse.)

Em português os verbos ter e haver ainda produzem um sentido bastante palpável sozinhos. Com na frase "eu tenho medo da sua brutalidade com as palavras."

(a menina só precisa de uma presença reconfortante. sem diálogos. até porque ela prefere os diálogos que tem com o vazio.)

De repente descobre-se que não há diálogos. Tão pouco personagens. Apenas uma sucessão de rubricas que significam muito pouco para qualquer um que não esteja familiarizado com a história a ser narrada.

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Os zumbis da minha infância não corriam. Os zumbis da minha infância se arrastavam atrás de suas vítimas. Curiosamente os zumbis sempre alcançavam as pessoas que corriam como loucas. Os zumbis da minha infância sim eram geniais. Arrastando seu corpo zumbi.

Desde 1968 os zumbis funcionam como uma metáfora social. Quer dizer, eles funcionam como metáfora social nos filmes que prestam pra alguma coisa...

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Seria mais fácil - tanto para mim quanto para você que está lendo isso - se eu conseguisse pelo menos uma vez escrever uma coisa com começo meio e fim. E que fizesse sentido sem conhecimento prévio de uma porção de outras coisas da minha vida. E por fácil não necessariamente entenda-se melhor. Só fácil mesmo.

Um estória com 'es' que começasse. digamos, em "era uma vez". Sem reinos distantes e cavaleiros audazes e donzelas em perigo e dragões cuspidores de fogo e lenhadores de coração bom e, por Deus, sem anões com chapéuzinhos pontudos. Só um "era uma vez", sabe?

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Era uma vez um zumbi. Um zumbi que se perguntava sobre a definição de sua personalidade jurídica. O zumbi, que chamaremos de Paul, o Zumbi daqui pra frente, não sabia se seria considerado morto ou vivo. Se poderia votar ou casar ou qualquer coisa do gênero. Porque Paul, o Zumbi era um ser único. Não existia ninguém no mundo igual a ele. O que o levou a pensar se algum dia alguém quereria se casar com ele.

Paul, o Zumbi aos poucos foi ficando obcecado com a idéia de amor. Porque parecia injusto que todos experenciassem uma coisa que parecia tão boa e tão ruim ao mesmo tempo e ele não. mas como Paul, o Zumbi era um zumbi, para ele era impossível sentir qualquer coisa. Física ou psicológica. Afinal zumbis tem todas as terminações nervosas mortas. E a produção de substâncias - como dopamina - não existe mais. Logo, se tornara imposível para o zumbi sentir.

Contudo, numa dessas viradas na estória, Paul, o Zumbi começou a sentir certas urgências. E foi ao médico. Porque alguém lhe havia dito: "Paul, o Zumbi, isso não é normal. Vai ver um médico."

No consultório o médico não sabia muito bem o que fazer. Porque é impossível analisar alguém, medicamente falando, que não possui sinais vitais. Mas aí, de repente o médico ouviu, muito fraca e com um volume muito baixo, uma pequena pulsação. Finalmente algo a ser analisado. Paul tinha batimentos cardíacos.

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Aonde tudo é ruim não existe nada de bom.

(a menina apaga o cigarro. respira. sente algum alívio por não ser um zumbi. e sabe que precisa continuar a história. mas não agora. só no próximo capítulo. precisa terminar. e vai. então ela pede paciência. pede sem saber para quem. mas pede.)

Por favor, eu peço paciência.

(sim, mais ou menos assim. ela pede. e sente muito fraco o batimento cardíaco.)

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